Compreende o luto e percebe porque cada pessoa o vive de forma diferente

1) O que é o luto? Quando o experienciamos?

O luto é um processo complexo que surge como resposta a uma perda. E embora o mais comum seja ouvirmos falar de luto perante a perda de pessoas significativas (por exemplo, a morte de alguém que amamos), este também pode ocorrer perante uma separação, na perda de um emprego, numa mudança de saúde irreversível ou até quando um projeto, uma oportunidade ou um sonho não se concretizam.

É complexo porque mexe com várias partes de nós: os pensamentos, as emoções, o corpo e até os nossos comportamentos, assim como, a forma como o vivemos é influenciada pela nossa história, cultura e contexto. Por isso, o luto é, ao mesmo tempo, uma experiência comum, porque todos passamos por ela em algum momento, e única, porque cada um a sente de forma diferente.

 

2) A diferença entre o luto esperado e o luto complicado

Apesar de cada pessoa viver o luto de forma diferente, é importante saber que existem reações “normais” e esperadas e outras que podem precisar de maior atenção.

No luto, é normal que a pessoa pense, sinta e até aja de forma diferente do habitual. Pode passar muito tempo a recordar quem partiu, sonhar com ela ou até sentir a sua presença. Pode sentir-se confusa, descrente ou até ter a sensação de que nada é real (desrealização). Também pode experienciar variadas emoções, como choque, tristeza, raiva, culpa, alívio, ansiedade. Estas emoções podem vir acompanhadas de sintomas físicos como aperto no peito, nó na garganta, fadiga/falta de energia, sensação de falta de ar, entre muitas outras. Também é comum sentir vontade de se isolar, evitar certos locais ou memórias, distrair-se facilmente, chorar com frequência ou sentir-se mais agitada.

Embora dolorosas, todas estas reações fazem parte do processo de luto. E esse caminho não é linear: haverá dias mais pesados, em que parece impossível lidar, e outros um pouco mais leves. Com o tempo, espera-se que “estas ondas” sejam menos intensas e menos frequentes.

No entanto, ao contrário do que se pensa, o tempo, por si só, não é suficiente. Em alguns casos, a intensidade destas reações não diminui com os meses, permanecendo intensas e incapacitantes, podendo até aumentar o risco de desenvolver outras doenças mentais. Nestes casos, podemos estar perante um luto complicado, e é fundamental procurar ajuda profissional.

Devido às suas características, algumas situações de perda podem deixar-nos mais vulneráveis ao desenvolvimento de um luto complicado. Alguns exemplos são perdas repentinas ou inesperadas, perdas por violência e/ou agressão, quando havia uma grande dependência em relação à pessoa perdida, situações de maior solidão depois da perda, ou outros.

Todavia, como já vimos, cada pessoa vive o luto de forma única. Por isso mesmo, as circunstâncias da perda, por mais duras que sejam, não determinam, por si só, que o luto se torne complicado. O que faz a diferença é a forma como cada um sente, interpreta e consegue lidar com essa perda.

 

3) O que podemos fazer para tentar promover um luto apropriado?

O primeiro grande passo é perceber que não existe uma forma “certa” de viver o luto e que não se trata de “passar à frente” a dor, mas sim de a sentir e integrar. Quando aceitamos isto, abrimos espaço para viver as diferentes emoções e dar palavras ao sofrimento. Negar, fugir ou ignorar a perda pode parecer uma forma de não sofrer, mas apenas atrasa o processo e não o resolve. Pelo contrário: quanto mais conseguimos falar sobre o que aconteceu e acolher o que sentimos em cada lembrança, mais preparados ficamos para encarar essa realidade como parte da (nossa) história que continua a ser construída.

O ideal é que possamos, ao longo deste processo, oscilar entre momentos de recordação, sofrimento e reflexão e momentos de distração, mudança e adoção de novas tarefas, rotinas e papéis.

Mas, acima de tudo, sejamos gentis connosco próprios. Falar sobre a perda, experienciar emoções ou até adaptar-se a novas circunstâncias de vida não é de igual facilidade para todos e é ok assim ser. Por essa razão, o apoio psicológico não é exclusivo para casos de luto complicado. Pode ser um auxílio importante – e muitas vezes necessário – em qualquer processo de luto.

Com carinho, Psicóloga Vânia Ferreira